terça-feira, 28 de dezembro de 2010

O MEIO AMBIENTE E A POLÍTICA

Estou postando um bom texto sobre a questão ambiental. Trata-se de uma reflexão política muito importante sobre o assunto.

Apreciem.
Prof. Geferson 


Entre o capital e o trabalho, a ecologia é neutra 
Poder-se-á dizer qualquer coisa de Al Capone, mas ele era um cavalheiro: o bom do Al sempre enviava flores aos velórios das suas vítimas... As empresas gigantes da indústria química, petrolífera e automobilística pagaram boa parte dos gastos da Eco 92. A conferência internacional que no Rio de Janeiro se ocupou da agonia do planeta. E essa conferência, chamada Cimeira da Terra, não condenou as transnacionais que produzem contaminação e dela vivem e nem sequer pronunciou uma palavra contra a ilimitada liberdade de comércio que torna possível a venda de veneno. No grande baile de máscaras do fim do milénio, até a indústria química veste-se de verde. A angústia ecológica perturba o sono dos maiores laboratórios do mundo, que para ajudar à natureza estão a inventar novos cultivos biotecnológicos. Mas estes desvelos científicos não se propõem encontrar plantas mais resistentes às pragas sem ajuda química. Buscam, sim, plantas capazes de resistir aos praguicidas e herbicidas que esses mesmos laboratórios produzem. Das 10 maiores empresas produtoras de sementes do mundo, seis fabricam pesticidas (Sandoz, Ciba-Geigy, Dekalb, Pfiezer, Upjohn, Shell, ICI). A indústria química não tem tendências masoquistas. A recuperação do planeta ou o que nos resta dele implica a denúncia da impunidade do dinheiro e da liberdade humana. A ecologia neutra, que se parece antes à jardinagem, faz-se cúmplice da injustiça de um mundo onde a comida sã, a água limpa, o ar puro e o silêncio não são direitos de todos e sim privilégios dos poucos que podem pagá-los. Chico Mendes, seringueiro, caiu assassinado em fins de 1988, na Amazónia brasileira, por acreditar no que acreditava: que a militância ecológica não se pode divorciar da luta social. Chico acreditava que a floresta amazónica não será salva enquanto não se fizer a reforma agrária no Brasil. Cinco anos depois do crime, os bispos brasileiros denunciaram que mais de 100 trabalhadores por ano morrem assassinados na luta pela terra e calcularam que quatro milhões de camponeses sem trabalho vão para as cidades abandonando as plantações do interior. Adaptando os números de cada país, a declaração dos bispos retrata toda a América Latina. As grandes cidades latino-americanas, inchadas, a rebentar pela incessante invasão de exilados do campo, são uma catástrofe ecológica: uma catástrofe que não se pode entender nem mudar dentro dos limites da ecologia, surda perante o clamor social e cega perante o compromisso político. 


(Eduardo Galeano)

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